Eis o resultado das interpelações feitas a alguns dos seus tripulantes e passageiros. As respostas é que não cabem na cabeça de ninguém!

Terça-feira, 30 de Novembro de 2010

Fruto das conversas tidas até agora, senti que a minha situação estava a agravar-se de dia para dia. Às tantas, pareceu-me que precisava de tomar pastilhas para a angústia. Por isso, fui ter com a Jane, que é uma das enfermeiras da Nave dos Loucos. O que é que te apoquenta? perguntou ela. Cada vez tenho mais medo, respondi. Ela, tirando as luvas de borracha com que tinha estado a espremer os furúnculos do cliente anterior, disse, batendo com o seu dedo indicador na minha testa:

 

 

Jane, sempre junto da água.

 

De uma vez por todas, tu tens de saber quais são os teus medos! E, enquanto lavava as mãos, acrescentou: Eu sei que tens andado por aí a fazer perguntas a toda a gente. Não admira que, progressivamente, tenhas cada vez mais medo. Mas é fundamental que fiques a saber quais são, de facto, os teus travões. Continua! E, quando os tiveres na tua frente, não entendas a situação com uma contrariedade. Mas desde já te digo que o teu medo principal é o da tua própria luz interna, se assim lhe quiseres chamar! Por isso, tens passado a vida a evitar falar destas coisas. Inconscientemente sabes que, se começares a trabalhar em ti com dedicação e afinco, algumas facetas da tua vida talvez tenham de ser alteradas. Por isso, não arranjes desculpas, porque o busílis da questão é o teu nível de apego. Estás pronto para mudar por dentro e por fora, se houver necessidade? Ninguém te imporá qualquer mudança; se houver necessidade de as fazer, terás sido tu que decidiste. O mais certo, porém, é que se te acontecer algo de desagradável, logo dirás que se trata de um castigo do céu, que estás a pagar o carma, ou qualquer outra baboseira do género. Afinal, talvez não queiras amadurecer para não ficares sem as coisas a que estás apegado e sem as pessoas de quem dependes, por achares que umas e outras te dão conforto e segurança. Se as coisas começarem a «descambar», como decerto dirás, vais sentir-te vítima das circunstâncias? Meu caro, para teu bem, deixa de pensar que és uma vítima do primeiro-ministro, da polícia, do clima, do teu patrão, da tua parceria, etc. Larga essa aberração que te mata aos poucos! Por quanto tempo mais vais ficar nesse pântano? … Bom, só tu saberás!

 

Sabia lá eu! Despedi-me apressadamente e saí dali apressadamente. Só nessa noite, quando estava a ver televisão, reparei que me tinha esquecido de pedir à Jane um comprimido para relaxar.

publicado por Gerador de posts às 08:51

Quinta-feira, 25 de Novembro de 2010

Tenho de confessar que a última conversa com a Aldima deixou-me a pensar e com a sensação de que faltavam dados. Por isso, pus-me a magicar quem é que poderia esclarecer as minhas dúvidas, mesmo correndo o risco de ficar ainda mais confuso. Quando a torneira da cozinha deixou de fechar como deve ser, percebi que o Yamashita, que é um dos canalizadores da Nave dos Loucos, podia ser a solução. Chamei-o e, quando ele acabou de arranjar a torneira, contei-lhe a conversa com a Aldima. Enquanto arrumava as suas ferramentas na mala, disse-me o seguinte:

 

 

Yamashita, num dos seus momentos de recolhimento.

 

De facto, a Aldima disse-te o essencial. Mas há outras formas de teres uma noção da distância a que estás do muro que te separa de Deus, se assim lhe quiseres chamar. Uma delas é avaliares a tua capacidade de reagires apenas com aceitação perante qualquer manifestação humana. Ou seja, até que ponto é que já te libertaste dos preconceitos, dos julgamentos e das críticas? Isto não significa que sejas incapaz de distinguir o que é correcto do que é incorrecto. Mas convém não apontar o dedo, lavrar sentenças, emitir ameaças ou sentir ódio pelo que sucedeu e por quem o provocou. Essas atitudes não atenuam nem resolvem nenhuma situação; apenas prejudicam quem as manifesta. Tu, neste caso. Outro indicador é a maior ou menor ausência de desejos pessoais. Este aspecto está relacionado com o teu grau de entrega aos níveis superiores (aqueles que tu achas que te transcendem, mas que na realidade fazem parte de ti), proporcionado pela magnitude da tua consciência. Portanto, tu só tens de eliminar a «distância» entre o coração – símbolo dessa «entrega» - e o ego, cuja missão é impedi-la. Quando o coração e o ego se juntarem, experimentarás o chamado «céu». Será de admirar que, depois de teres deixado de experimentar as aberrações da dualidade, te consideres no «Paraíso»? Não sabemos o que isso seja, mas sabemos que é possível. Para concluir a conversa, que tenho de ir desentupir uma banheira, a «distância» que te separa do tal «muro», corresponde à distância que separa a teoria, que tu já conheces de ginjeira, da prática que tu ainda não sabes o que seja!

 

Raios me partam se eu algum dia serei capaz de compreender o que esta gente me anda a dizer! Vou ter com elas na esperança de ficar mais esclarecido, mas a confusão cada vez é maior. São excelentes pessoas. Algumas até são minhas amigas, mas... Haja paciência! Que desassossego, credo!

publicado por Gerador de posts às 09:29

Terça-feira, 23 de Novembro de 2010

A Aldina, que é uma das desenhadoras da Nave dos Loucos, é realmente uma senhora muito interessante. Por isso, de vez em quando, saio à sua procura para trocar impressões com ela. Foi o aconteceu no passado domingo. Desta vez não estava sentada ao estirador, mas na beira da piscina a comer batatas fritas. Quando me perguntou como é que eu me sentia, respondi: Cada vez mais baralhado! E ela: Como assim? E eu: Ouve lá, como é que podemos conhecer a distância até ao muro que nos separa de Deus?

 

 

Aldina, num momento de lazer.

 

Aldima pousou calmamente o pacote das batatas e respondeu: Bom, antes do mais, não se pode medir uma imagem. A «distância ao muro» de que falas é apenas uma forma visual para facilitar a compreensão. Na realidade, não há muro nenhum, assim como não há caminho para lá chegar. São imagens representativas de ideias, para percepcionarmos melhor o que se pretende dizer. Respondendo à tua pergunta, há indicadores que tu podes utilizar para ficares com uma ideia de quanto te falta percorrer do tal caminho que não existe! Um desses indicadores é a serenidade interna. Ou seja, aconteça lá o que te acontecer, seja uma experiência negativa, seja um episódio altamente reconfortante, tu és capaz de te manter no teu eixo de equilíbrio. Outro indicador, que decorre do que acabei de te dizer, é o grau de conflito que persiste em manifestar-se na tua vida, envolvendo as pessoas com quem estás de relações cortadas, ou aquelas que, simplesmente, não toleras. Esta conflituosidade, como é natural, pode provir de conflitos antigos, isto é, de questões que ainda estão por resolver, ou daquelas disputas que desencadeias e alimentas diariamente. Esta situação, porém, como facilmente poderás reconhecer, é particularmente estranha. Repara bem: que sentido faz investires na resolução de conflitos antigos, ao mesmo tempo que inicias outros?

 

Quando a Aldima acabou o seu discurso, fiquei calado, porque não sei que mal possa haver em esvaziar por um lado e encher pelo outro. Afinal a vida é mesmo assim. O que eu sei é que aquelas batatas fritas abriram-me o apetite. Fui ao bar comprar um pacote delas, mas não regressei à conversa; fui comê-las sozinho, sentado num recanto onde ninguém me chateasse.

publicado por Gerador de posts às 09:25

Quinta-feira, 18 de Novembro de 2010

­Esqueci-me de contar que, no sábado passado, tive uma conversa com o Korsakov, que é um dos electricistas da Nave dos Loucos. Fui apanhá-lo, sentado no chão e encostado à parede, a descarnar os fios de um ar condicionado. Perguntei-lhe logo: Sem querer interromper o teu trabalho, tu achas que o desejo de ser amado poderá ser um produto do nosso ego?

 

 

 

Korsakov, num dos seus passatempos favoritos

 

 

O Korsakov (que, segundo consta, ainda é um aparente afastado do Rimsky) pousou o alicate, pensou uns segundos e respondeu: Só há uma espécie de Amor porque não se trata de um sentimento; o Amor é uma radiação que gera sentimentos e, portanto, várias emoções. Se tu manifestares essa sublime radiação verdadeiramente, terás de aceitar até a existência daquilo que, eventualmente, te poderá prejudicar. Assim, se já vibras Amor, provas que já te descartaste daquela parte da tua estrutura que dificulta a expansão da consciência e impede o reconhecimento das leis superiores. Na Terra, o Amor foi subdividido em amor romântico, fraternal, familiar, etc., que tu manifestas direccionando-os para aqueles de quem gostas, enquanto reservas o ódio para quem te desagrada! Uma das características deste amor terreno é a mutabilidade. Ora, o que pode transformar-se rapidamente num sentimento de repulsão, pode ser muitas coisas, mas Amor é que não é. O Amor a que me refiro caracteriza-se pela constância, variando apenas o grau de intimidade que se estabelece com os outros. Todos devem de ser amados de igual modo, mesmo que trilhem caminhos desaconselháveis ou sejam até responsáveis por grandes tragédias. Meu caro, o Amor é a própria essência da vida; portanto, não tem opostos. Por isso é constante e incondicional.

 

Fiquei varado! Pensei logo na minha ex namorada e no pulha que ma roubou. Cocei as costelas e deixei o Korsakov a lidar com os seus queridos fios eléctricos. Fui apanhar ar. Nada como uma brisa fresca, principalmente se houver uma mulher bonita por perto. … O que não foi o caso.

publicado por Gerador de posts às 20:00

Terça-feira, 16 de Novembro de 2010

Hoje de manhã tive a grata satisfação de encontrar o Osmiro, que é o comandante da Nave dos Loucos. Devido aos seus afazeres não é fácil vê-lo por aí, mas hoje aconteceu. Por isso, aproveitando um momento em que ele parecia estar disponível, aproximei-me e, indo directamente ao assunto, perguntei-lhe o seguinte: Olha lá, tu achas que a alma gémea existe?

 

 

Osmiro, o comandante, a fazer o seu yogazinho

 

Osmiro, olhou para mim com certa estupefacção, virou o olhar para o horizonte e proferiu as seguintes palavras: Talvez sim, talvez não. Quem sabe? Talvez essa coisa da alma gémea seja uma grande treta, ou talvez outra pessoa ande por aí à tua procura, convencida de que tu és a alma gémea dela. Mas, enquanto alguns de nós passarem a vida à procura da sua alma gémea, não se encontram a si próprios! Estarão essas pessoas à espera de se completarem através de alguma coisa exterior a elas? Meu caro, a tua vida terrena, observada do ponto de vista espiritual, é como se tu estivesses numa ilha deserta. Não quer dizer que outras pessoas, com quem estabeleceste vários tipos de relações, não possam ter um papel importante na tua vida. Claro que sim. Mas qualquer análise que tu faças é como espreitares pelo buraco da fechadura; só se vês um bocadinho. Muito fica por ver. A verdade é que as coisas não são o que parecem. Repara: Tu dizes que o sol se levanta todas as manhãs no horizonte. Contudo, é a Terra é que se «inclina» para o lado contrário àquele de onde o sol parece levantar-se! Queres outro exemplo? Se o dia está nublado, dizes: «Hoje não há sol!» Mentes, pois o sol está apenas encoberto. Um terceiro exemplo: quando estás triste, deprimido e angustiado, poderás ter vontade de dizer: «Hoje não há eu». Lembra-te, porém, de que apenas uma sombra paira sobre ti. Aprende tu a elevar-te acima dela e verás todo o teu esplendor. Quando assim acontecer, para que quererás a tua alma gémea? Para que a quererás se passaste a viver completo?

 

Depois disto, foi a minha vez de olhar para o Osmiro com estupefacção. Achei que a coisa foi muito bem explicada, mas confesso que, se já estava baralhado, mais baralhado fiquei. Que outra coisa fazer então senão virar-me contra o vento e acender um cigarro?

publicado por Gerador de posts às 09:56

Quinta-feira, 11 de Novembro de 2010

Confesso que tenho andado um pouco desorientado. As conversas com alguns dos tripulantes e passageiros da Nave dos Loucos têm-me posto a pensar em coisas que nunca me tinham ocorrido. De forma que, anteontem, estava eu a ver as gaivotas, quando me ocorreu ir falar com a Otília, que é a cabeleireira da Nave dos Loucos, para tirar uma dúvida que me andava a atormentar. Encontrei-a na sauna, com uma toalha a embrulhar a cabeça, e logo lhe confessei: Ó Otília, há dias alguém me perguntou qual era a minha missão espiritual? O problema é que nem sequer percebi o que é que essa pessoa queria dizer! Podes ajudar-me?

 

 

Otília, a cabeleireira, de férias  na Riviera Maia!

 

Aí, a Otília, passando o dedo pelas sobrancelhas, para escorrer o suor acumulado, disse-me assim: Sabes, neste momento, algumas pessoas acham que a sua missão espiritual tem de passar por trabalhar para o Espírito. No entanto, o objectivo não deveria ser trabalhar «para» o Espírito, mas sim trabalhar «com» o Espírito. Se trabalhas para o Espírito decerto terás a sensação de seres uma espécie de assalariado do céu. Ou seja, se a tua participação deixar de ser precisa serás descartado. Trabalhar com o Espírito, porém, irá transmitir-te a sensação de fazeres parte do «quadro», se é que entendes a analogia. Ou seja, passas a ser um elemento do Grupo de Intervenção Interdimensional. Colaboras incarnado no planeta, enquanto outros se mantêm onde estão, fazendo o trabalho específico do plano onde se encontram. O facto de reconheceres que trabalhas «com» o Espírito, tem a grande vantagem de, pouco a pouco, te desabituares de olhar para cima. Enquanto olhares para o céu, crendo que o Omnipotente está lá em cima, não podes deixar de te considerar um insignificante! Os que trabalham para o Espírito dizem: «Eu faço porque Deus (ou “eles”) disse para eu fazer». À primeira vista parece que cumprem ordens. Mas aqueles que já adquiriram a consciência de que fazem parte Grupo de Intervenção Interdimensional, ou seja, que trabalham com o Espírito, expressam-se de forma diferente. Dizem, por exemplo: «Eu faço porque a minha intuição assim o diz». Se estás interessado em crescer verdadeiramente, é provável que venhas a passar por uma fase em que te parece que trabalhas para o Espírito. É quase inevitável. Mas, um dia, certamente sentirás que o teu estatuto passou a ser diferente. Poderás então garantir que deixaste de trabalhar «para» e passaste a trabalhar «com»!

 

Acho que nunca o calor da sauna me incomodou tanto. Comecei a sentir tonturas e a ter dificuldade em respirar. O suor, a descer pelos flancos, fazia-me umas cócegas muito irritantes. Desculpando-me de que precisava de um duche frio, fiz um adeus apressado à Otília e saí daquele cubículo asfixiante. Não me interessava que estivesse mau tempo; o que eu queria era apanhar ar.

 

 

publicado por Gerador de posts às 14:24

Terça-feira, 09 de Novembro de 2010

A noite passada organizaram um espectáculo de dança, nada de especial por sinal. Eu, pelo menos, achei piroso. Falo dos cenários e da coreografia, já que a Pilar, a bailarina principal da Nave dos Loucos, é de se lhe tirar o chapéu. Por isso, fiquei na sala na esperança de que ela aparecesse. E, de facto, passado um bocado, lá apareceu ela com as suas calças justas e o cabelo arrepiado num carrapito. Conversámos, e a conversa não tardou a enveredar por temas que eu nunca imaginei que viesse a abordar com ela. Tanto assim que, às tantas, ouvi-me a perguntar-lhe: Outro dia, alguém me disse que a minha missão era levar as pessoas para a vida espiritual. O que terá levado essa pessoa a dizer isso – o que me pareceu o maior absurdo do mundo – mesmo sabendo que eu fujo dessas coisas a sete pés?

 

 

Pilar, a bailarina, com um amigo.

 

Ela, olhando para mim com as suas longas pestanas postiças e com um sorriso atrevido nos lábios, sussurrou: Pode ser que sim, pode ser que não; quem está no comando és tu. Se achas que essa revelação é válida, vai em frente. Mas, meu amigo, se vais seguir por essa via, não te esqueças de respeitar o livre arbítrio daqueles com quem conversares. Ou seja, não te armes nem em evangelista, nem em missionário. É natural que te perguntes como é que tu, um céptico medroso e desconfiado como todos os cépticos, será capaz de seduzir pessoas para a vida espiritual. Pois eu digo-te que é irradiando paz, sendo doce e firme ao mesmo tempo, e não mostrando medo. Não precisas de organizar reuniões, nem de fazer prelecções, nem coisa nenhuma; limita-te a levar a tua vida em paz. Poderás achar que assim não convences ninguém, mas não é verdade. Alguns vão querer saber como adquiriste tanta segurança e coerência. Aí, tu explicas. O mundo está no estado em que está porque acabou o tempo de dizer uma coisa e fazer outra; isto é válido a nível individual, familiar e colectivo. Estamos num tempo de transparência; até os políticos o dizem… embora, depois, sejam mais opacos do que chumbo! Para seres coerente, tens de ser capaz de conjugar a tua vida «espiritual» com a tua vida quotidiana, porque, afinal, são uma e a mesma coisa. Qualquer pessoa não pode ser um foco de luz dourada quando está a meditar, e um pulha durante o resto do tempo!

 

Fiquei a olhar para ela, de olho escancarado. Como quebrar aquele silêncio? Pilar, a bailarina, aproveitou aquele impasse para colocar um cigarro na sua longa cigarrilha e, usando o seu belo corpo, dar-me a entender que queria que eu o acendesse. Mas como, se eu não fumo? Ela, encolhendo os ombros, desandou para outra mesa. E eu ali fiquei, muitíssimo apreensivo, a suar, tentando adivinhar que raio de enredo teriam os próximos capítulos na minha vida.

 

publicado por Gerador de posts às 11:59

Quinta-feira, 04 de Novembro de 2010

Ontem, passei o dia completamente desorientado. Andava eu perdido no labirinto de corredores quando esbarrei com Zadros, que é o timoneiro da Nave dos Loucos. Saudou-me cordialmente, e eu expliquei-lhe que não conseguia atinar com o caminho. Encarou-me serenamente e disse que bastava que eu seguisse as setas e respeitasse outros sinais, que tinham sido postos em pontos estratégicos, precisamente para as pessoas não se perderem. Esbugalhei os olhos, pois nunca tinha reparado neles. Zadros, ficou admirado com a minha expressão e perguntou-me o que me preocupava. Respondi-lhe com uma pergunta: como posso eu ultrapassar o medo de perder alguém?

 

 

Zadros, o timoneiro, com saudades do mar.

 

Ele disse: Ah, então é isso! Ó homem, não vale a pena preocupares-te porque tu não podes perder, simplesmente porque não podes possuir. Portanto, não possuindo, não podes perder. Se há perda é porque havia posse. Ora, se há vírus capaz de condicionar a paz de espírito, esse é o do sentimento de posse. É como um vento contrário, soprando no Caminho, que dificulta a progressão. Repara: quando tu dependes de uma pessoa estás a fazer dela uma «fornecedora» do que julgas necessitar. Então, quando ela desaparece, porque morreu ou se foi embora, tu passas a sentir-se bastante desamparado devido à quebra no «fornecimento». O mais curioso – e anacrónico - é que nós tornamo-nos dependentes deste e daquele na esperança de nos livrarmos do sentimento de desamparo! Consegues imaginar maior parvoíce? Todos os toxicodependentes, por exemplo, receiam perder o seu fornecedor, porque sabem o que custa a ressaca. Mas há casos em que a ressaca do corpo emocional, devido ao sentimento de perda, pode ser mais violenta do que a da cocaína!

 

Bem, se eu já estava desorientado, mais desorientado fiquei. Despedi-me do Zadros, o timoneiro, sentindo que só queria sair dali. Desandei corredor fora, mas ele interrompeu-me a minha fuga gritando: Não é por aí!

publicado por Gerador de posts às 21:50

Terça-feira, 02 de Novembro de 2010

Hoje de manhã dei de caras com Nobutaka, o hoteleiro, um dos passageiros da Nave dos Loucos. É curioso que nunca me tinha cruzado com ele. O seu ar simpático e receptivo cativou-me de imediato. Entabulámos conversa e, quando ele me disse que tinha cinco filhos, eu não resisti a perguntar-lhe: Porque é que as pessoas têm filhos? Na tua opinião, qual o propósito de trazer uma criança ao planeta?

 

 

Nobutaka, muito entretido uma tarde de domingo caseiro.

 

Ele, com um ar de quem é especialista na matéria, pôs-me amigavelmente a mão no ombro e proclamou: Certamente haverá muitas respostas para as tuas perguntas, meu caro. Por exemplo, porque é costume, porque é motivo de orgulho, porque é biologicamente correcto, porque compõe a família, porque é preciso dar continuidade à espécie, etc. Estas são algumas das respostas comuns, comezinhas, típicas do plano humano. Mas se tu pretendes abrir a tua consciência, tens de começar a acrescentar outro tipo de razões, derivadas de uma visão mais ampla. Tu já me disseste que não tens filhos. Mas, se algum dia vieres a ter um, essa criança não virá à Terra para tu lhe fazeres bilú bilú, como se fosses pateta. Também não será para te embeveceres com ela ou, no pior dos casos, para perderes as estribeiras durante a noite porque ela, berrando desalmadamente, não te deixa dormir. Se algum dia vieres a passar por essa experiência procura lidar com a criança como se ela fosse um emissário dos planos superiores, alguém, a quem deves honrar e saudar. Uma criança não é só um complexo biológico altamente sofisticado; é, antes disso, um complexo vibracional que, uma vez materializado na Terra, espera que tu lhe proporciones as condições, não para ser o que tu gostarias que ela fosse, mas para poder concretizar o que cá veio fazer. Nem tu nem ela sabem do que trata, mas isso não tem importância. Só tens de estar atento aos sinais. Sem alimentares expectativas, está claro.

 

O Nobutaka pode ser uma excelente pessoa, um incomparável pai de família, um trabalhador incansável. Eu, porém, não me quero ver nesses assados, ainda por cima baseando-me em argumentos que ninguém percebe!

publicado por Gerador de posts às 11:56

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